domingo, 24 de agosto de 2014

Sociologia do Conehcimento

É segunda-feira e começa o mês de maio.  Eu me deparo com a circunstância de que conhecer a sociologia é diferente de fazer sociologia; realizam-se transações. O que importa é que, sexta pela manhã, me preparo para ir a Recife no meio da semana, um seminário do sociólogo moçambicano Elisio Macamo, professor na Basiléia.



     Era 7 de maio. Saio de casa as 10. Chego na Cidade Universítaria e pretendo assistir uma atividade no décimo segundo andar do prédio do Centro de Filosofia e Ciências Humanas, no Programa de Pós Graduação em Sociologia, na Universidade Federal de Pernambuco. Macamo esteve na UFPE pela primeira vez em 2009 e desenvolve estudos sobre a linguagem na sociologia e sobre África.

Começa a sua exposição com um conto de Borges acerca do jazz e uma citação a las Casas sobre a escravidão dos índios. Joaquim Nabuco é lido em narração sobre não haver o Paraguai. Abrindo um precedente histórico na literatura em ciências sociais para o desenvolvimento do argumento de que “e se a África não existisse?” valendo-se na noção de argumento contrafactual de Weber, em diálogo com a linguagem dos clássicos.

– Transação entre o ser que trabalha ao ser que não trabalha. Algo sublime e ao mesmo tempo, tão violento.

Assim seria um deserto guarani o Paraguai, se não fosse os jesuítas.

Retornando ao debate metodológico e epistemológico, o viés da parcialidade, auto seleção, auto engano são levantados.

– “O Brasil existe”? (o Antropólogo Eduardo Viveiros de Castro disse, uma vez, o Brasil é uma circunstância).

Mundos alternativos; outros são possíveis como em Voltaire e Leibinz. Mas onde está a qualidade (validade?) dos conceitos: reféns da investigação ou dos objetos?  Ou da construção da relação epistêmica?

O paradigma da sociedade global desenvolvido por Ianni aparece a fim de por em discussão o “nacionalismo metodológico”. ( acerca deste ponto, penso que o caráter metodológico distintivo é a cosmovisão de um povo, sua língua, uma linguagem que distingue o modo de ver o mundo e assim construir uma realidade, muitas vezes existente fora de nossos conceitos.)

O embate entre objeto e teoria é recorrente em toda a História da Sociologia. Macamo aponta nesse percurso uma certa forma de “miopia metodológica”, indicando-nos que não só “um” conhecimento é possível. A outra face desse embate, que se dá entre verdade e epistemologia, é resultado da necessidade (imposição?) de controle e método na produção do conhecimento em Ciências Sociais.

A parcialidade introspectiva abre brechas no linear arranjo da história, a partir da “probabilidade objetiva” entendida como um antecedente. Assim, enquanto a histórica preocupa-se da causa do fenômeno social, a sociologia ocupa-se da circunstância na qual se manifesta o fenômeno. Opera-se uma crítica da causalidade como ponto de explicação, evoca-se a plausibilidade para dar conta da inconstância da vida social, ou seja, indica-se uma sensibilidade metodológica para reconhecer um conjunto de circunstâncias na qual se torna possível elaborar uma teoria capaz de ser visível na realidade e na História. Considerando que não há um vocabulário capaz de falar de nenhum lugar. Arquimedes, falou faz muito tempo sobre uma boa lavanca para levantar o mundo, isto é um conceito, uma forma elaborada de linguagem na qual o mundo se realiza.

A constituição social de muitas regiões da África, assim como da Índia e boa parte do Oriente (como mostra E. Said) só se deu (da maneira que foi) por conta da colonização, inclusive as línguas nessas regiões seriam outras, de difícil contato para as outras sociedades ao redor do globo. Então a globalização, fica claro, torna-se a condição de possibilidade de realização de uma dominação ética e étnica.

Mas essa dominação tem também seus disputantes no certame. De um lado a tradição germânica desde Vico e Herder, passando por Wilhem Dilthey – e sua ciência do espírito – Rickert e Wileband, postos entre valores e cultura (respectivamente) frente uma França e sua ideia de civilizacion. A partir da deflagração desta tensão, ganham importância os papéis que conceitos começam a desempenhar na sociedade bem como na construção social da realidade e seus códigos e normas de condução, organização e orientação da vida em socieade, a partir de certa altura da modernidade.

Mas antes dessa impostura, cabe resaltar que a Europa nega a História que a formou. Escondendo, e ou quando não eliminando, as contribuições do oriente e do norte africano do patrimônio cultural que a formou, construindo no imaginário uma referencia à uma Grécia mítica, como mãe do ethos ocidental, ignorando o constante dialogo (guerras, trocas, matrimônios) dos gregos com o restante do mundo conhecido até aquela época. Bem como a literatura criada com base na inspiração do oriente e do Novo Mundo, e a África nas Artes Plásticas). Desdobra-se daí uma ontologia, que não existia. Um paradigma do exotismo e formas funcionais ligadas a razão instrumental iluminista de representar o mundo e as relações sociais.

            Retornamos assim a tensão: sujeito e conceito. Nesse contexto concebo a ideia de que a razão é o momento do movimento dentro do caos, saber encontrá-la é trabalho de encantado e encantamento dos espíritos e do tempo.

Um telefone celular toca na sala, durante a fala do Professor Elísio Macamo. Todos silenciam e reconhecem o constrangimento, o professor então de repente exclama uma pérola sociológica:

– “Estou a provocar defuntos”.

Aludindo que pode ser o espírito do Nietsche chamando ao telefone. E a sala se resolve em risos.

O debate envereda pelo provincianismo da sociologia e uma crítica a essa “regionalização”, seja nacional, linguística ou até mesmo as antinomias (Norte/Sul ou Ocidente/Oriente e as subnoções periféricas como América Latina e etc...)

A etnografia surge, em comentário, como método à sociologia, uma técnica epistemológica, um recurso teorético, uma prática filosófica e política.

– Valendo-me do mesmo argumento do Prof. Me questiono então:  Se a colonização não foi uma barbárie, 
o que foi?


O Seminário alcança a orientação de “desnaturalização do conceito” como um primeiro passo para elaborar qualquer contribuição à Sociologia.

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