sexta-feira, 29 de agosto de 2014

Aviso Maia

Apontamento solto
                                                           – A Reinvenção do último milênio

O homem caminha sobre a linha do tempo e da cultura, na corda bamba da ciência e dos seus conceitos pré-conceituados, entre a angústia da influência e a necessidade de originalidade e primazia, nas fronteiras entre o metafísico e o que chamamos realidade. A partir da convicção da hibrida relação dos indivíduos inter e intra-subjetiva, apreende-se que o conjunto de cosmologias e cosmogonias tão diferentes produzidas por diversas culturas e díspares costumes propõem a reflexão da implosão da hegemonia da sociedade ocidental.

Em séculos que a verdade vive a ser absoluta, a realidade tão arbitrária, a natureza furiosa quão violenta, o estado ainda mais autoritário quanto repressivo e as portas para a transcendência obnubiladas pela hegemonia da reprodução, a sociedade esse ente hibrido por não dizer complexo, embriaga-se no consumo e vislumbra, na vigília entre o prazer e o luxo, os escombros de toda a ruína metodicamente culturalizada nas estantes e prateleiras universais de toda a materialidade da produção intelectual hodierna.   

É o momento em que o indivíduo descobre que o marco do seu estar na terra é usufruto de sua natural organicidade a mesma, e o homem, possivelmente, o exemplar mais bem acabado da natureza, quiçá dizer, prova cabal da expansão e desenvolvimento intelectual, e o que é mais importante, num processo de alargamento e expressão coletiva, desde o tempo dos clãs e das tribos, das sociedades onde os livros ainda não existiam, eram e continuarão sendo as formas de organização e modos de produção social grupista que conseguiram o êxito de se perpetuarem.

Desde a matriz antropológica mais ancestral, sejam os aborígines na Austrália ou mesmo, o profético povo Maia do continente americano, até a época vigente entende-se o principio axiomático da existência humana como a relação direta entre a vida e suas lacuna então supridas por respostas metafísicas e existenciais, mas que por sua vez logravam êxito no organograma social, pois que sua ação e difusão nas consciências são realizadas através do sistema de representação do simbólico como no caso dos totens. Que são expressões ou caracteres sociais que permitem ao sujeito coletivo determinado entendimento do real – representado na cultura – e suas manifestações na perspectiva do indivíduo.

  Bispar o crepúsculo pela fenda de uma sabedoria que é a ilusão de que qualquer um dos homens possa explicar a vida ou ser deus se acaso ele existisse; nesse momento o indivíduo encontra-se com as fronteiras do infinito, o todo anterior é proibido, só talvez um último reflexo fugindo do espelho em estilhaços da modernidade, desta malfadada projeção do desenvolvimento humano, neste momento, onde a onda se erige e se parte, e se recente de não haver sido. Pois que, ainda que o artista pereça diante da arte, uma ação intelectual só pode ser combatida com outra, enquanto a multidão semi-infinita de homens que se proliferam pelo planeta, não se apercebe de que a última das máximas da condição humana tende a ruir.

O civilizar-se, isto é, tomar para si do corpus social as mais diversas e plurais influências, é parte do projeto de funcionamento da sociedade, pois que esta possui um fim em si mesma, propiciadora das circunstâncias, predecessora do arquiteto, esse ente inerente a essência humana, o que de sobremaneira determina o limite das interações societais e do individuo a mercê de si. Assim o solipsismo comanda a fundação de cada personalidade em si, do descobrimento do eu pelo indivíduo, e sem pestanejar apostaria que é a representação mais aguda da nossa forma de organização social atual, narcisista e sistematicamente individualista. Tendo como pressuposto este desolador cenário, o epílogo só poderia se constituir de um monólogo sem sombras, mas com certeza repleto de fantasmas e incontáveis espelhos que se refletem.

Não obstante, a razão que o esforço precede e produz o pensamento, tal qual antecede à prosa, a poesia, arte imarcescível e indubitável esboço da busca pelo estratagema social mais adequado para a explicação dos fenômenos sociais, assim como a arte das palavras na sua operação obscura “entre o ser e o nada” desfaz ecos entre o individuo e seu outro contido, permite que através do desvelamento das combinações e o rearranjo das probabilidades, ocorra um eqüidistante paralelo estrutural entre a articulação da linguagem e sua representação com o todo circundante.

 A mediação entre a ordem e a operação, é o princípio heurístico no qual o leitmotiv antroposociológicos, econopolíticos e transculturais se resguarda na consubstanciação das cores da época em suas diversas matizes e seus mais diversos aspectos, que recolhidos a um canto da racionalização descolam a consciência fazendo-a decolar em direção a eternidade do indivíduo em sua infinita finitude, descontinua, decomposta entre a última estrela que caiu, e o fio de luz que se escorre do crepúsculo. 


A humanidade destrói/transforma a natureza para torná-la na contracorrente da ordem, erigindo o caos anterior para reconstruí-la num plano superior.  À desestruturação operada no corpus social pela figura do intelectual precede uma reestruturação de uma nova ordem. A atual influência gravita em torno do ser-se a civilização, de balizar a alegoria social em habictus, e reproduzir seus costumes e crenças, é construir-se em bases outras se alheando num per si sem sentido que no “eu”, prenhe de outros tantos, instaura-se a “persona coletiva” e suas multifacetas ante as  interfaces do paradigma societal contemporâneo.